terça-feira, 10 de junho de 2008

Cardiopatias e Treinamento de Força

Cardiopatias e Treinamento de Força - Revisão de Literatura

Introdução

O desenvolvimento tecnológico decorrente da industrialização, a formação e a urbanização das grandes metrópoles trouxeram conseqüências, ligadas diretamente à saúde da população. Uma comunidade que, outrora, era naturalmente dinâmica, e sujeita a poucos fatores estressantes, passa a conviver com problemas relacionados com a inatividade física, dentre eles, a obesidade, a hipercolesterolemia, a ansiedade e a hipertensão arterial.
Grande ênfase tem-se dado às medidas, não farmacológicas, de mudanças dos hábitos de vida para prevenção e controle dos níveis tensoriais elevados, que devem ser implementadas para todos os hipertensos, mesmo aqueles em uso de droga. Dentre essas medidas, vem se destacando a prática regular de exercícios físicos, componente importante na melhoria da qualidade de vida. Estudos constataram uma menor morbidade e mortalidade, por doenças do sistema cardiovascular, em indivíduos treinados fisicamente, com benefícios evidentes no subgrupo de hipertensos. Essas medidas não devem ser acrescentadas apenas no grupo de hipertensos, mas em outras cardiopatias. Tendo isso em vista, o objetivo desse artigo é revisar artigos que abordem o treinamento de força e seus possíveis benefícios em indivíduos cardiopatas.

Hipertensão Arterial

Segundo Wilmore e Costill (1), hipertensão (elevada pressão arterial) é definida como uma pressão arterial cronicamente aumentada. Em geral, a linha divisória entre a pressão normal e a hipertensão está situada em 140/90 mmHg (tabela 1).
A pressão diastólica é, normalmente, o principal índice de hipertensão, embora pressões sistólicas acima de 140 mmHg não estejam necessariamente associadas a doenças.
A fisiopatologia da hipertensão não é bem compreendida e pode ser decorrente de:
1) fatores genéticos;
2) ingestão excessiva de sódio;
3)obesidade;
4) resistência à insulina;
5) inatividade física;
6) estresse psicológico;
7) uma combinação desses fatores;
8) outros fatores que devem ser substanciados ou identificados.
A hipertensão faz com que o coração trabalhe mais intensamente do que o normal, visto que ele tem de expelir o sangue do ventrículo esquerdo contra uma maior resistência. Há também a imposição de uma grande tensão sobre as artérias e as arteríolas sistêmicas. Cronicamente, esse estresse pode fazer que o coração aumente de tamanho e as artérias e arteríolas apresentem cicatrizes, endureçam e tornem-se
menos elásticas, podendo levar à arteriosclerose, ao infarto do miocárdio, à insuficiência cardíaca, ao acidente vascular cerebral e à insuficiência renal.


Durante muito tempo, os indivíduos hipertensos eram desencorajados a participarem de programas de treinamento de força, devido a uma obstrução do fluxo sangüíneo durante contrações musculares estáticas (2). Porém, recentemente, exercícios de força vêm ganhando atenção, principalmente os que possuem períodos de intervalos, não obstruindo assim, continuamente, o fluxo sangüíneo; além de outras vantagens desse tipo de treino, como aumentos na força e na resistência muscular, melhoras na composição corporal (3).
Com isso muitas pesquisas foram e são realizadas nessa área, somando-se ainda ao fato que o treino de força possui variáveis que, dependendo da forma como são manipuladas, pode trazer benefícios semelhantes a atividades aeróbicas, incluindo resistência cardiorrespiratória (4). Nesse contexto se encaixa o treinamento de força em circuito (TFC), que foi definido por Gettman et al. (5) como a performance de várias repetições utilizando uma moderada quantidade de peso de um modo contínuo, movendo-se de uma estação a outra com um mínimo de intervalo entre as estações. Muitos estudos demonstram que o TFC provoca adaptações positivas na força muscular, composição corporal e um potencial incremento na capacidade aeróbica (5).
Segundo o estudo de Harris e Holly (6), o TFC possui vários benefícios com o mínimo de risco, inclusive para indivíduos com pressão arterial (PA) elevada. Nesse estudo foi avaliada a eficácia e a segurança do TFC em indivíduos normotensos. Os indivíduos treinaram 3 vezes por semana, durante 9 semanas. O treino era composto por 3 séries em 10 estações, a 40% de 1 repetição máxima (RM). O estudo contou com 26 indivíduos sedentários (10 no grupo de exercício – EX – e os 16 restantes no grupo controle – CTL). Foram avaliados a composição corporal (densitometria e somatometria – dobras cutâneas), consumo máximo de oxigênio (VO2 máx.) de modo indireto (esteira e ergômetro de braços), força máxima, PA e Freqüência Cardíaca (FC) após 5 minutos sentado em repouso.
No grupo EX, nos exercícios supino e leg press, houve um aumento de 12,3 e 53,0% na força máxima, respectivamente e o quilagem total por circuito aumentou 57,0%. O peso corporal e a massa magra aumentaram 1,2 e 2,2%, respectivamente, enquanto a soma das dobras cutâneas diminuiu 9,3%. O VO2 máx. (avaliado em esteira), quando expresso de maneira absoluta, aumentou 11,4% e 7,8% quando expresso de maneira relativo ao peso corporal e 6,7% quando relativo à massa magra. O VO2 máx. avaliado no ergômetro de braço, expresso de forma absoluta, aumentou 21,1%. A FC de repouso aumentou 36%, a PA sistólica aumentou 4% (estatisticamente insignificante) e a PA diastólica diminuiu 7%. No grupo controle, nenhuma mudança significativa foi obtida em todos os aspectos avaliados. Durante os períodos de treino, a PA sistólica e diastólica não excederam 190 e 106 mmHg, respectivamente e foi encontrado um pico na FC de 192 batimentos.minuto-1 nos indivíduos.



Buck e Donner (7) relatam que indivíduos que possuem, em suas atividades diárias, um maior componente isométrico apresentam uma menor probabilidade de vir a apresentar hipertensão arterial.
Levando em consideração essa informação, Wiley e colaboradores (8) propuseram um estudo em que foram avaliados os efeitos de contrações isométricas (em exercício de contração de mãos) em indivíduos com PA normal e em normotensos. O grupo dos indivíduos saudáveis (estudo 1), com PA em níveis normais, contava com 10 indivíduos (8 terminaram o estudo) e o grupo controle também contava com 10 indivíduos (7 terminaram o estudo). As medidas de PA eram aferidas após 10 minutos após os voluntários terem sentado, em repouso e 5 minutos após o início do exercício de contração de mãos. A carga do grupo que realizou o exercício era de 30% da contração voluntária máxima (teste realizado num dinamômetro específico) no braço dominante e a contração durava 2 minutos, repetidas 4 vezes, com 3 minutos de descanso entre as contrações. Foi avaliada a PA nos últimos 20 segundos de contração na primeira e na quarta série, para verificar a magnitude do aumento da PA. Os exercícios eram realizados 3 dias por semana durante 8 semanas. Para os indivíduos normotensos (estudo 2), obteve-se 10 voluntários (todos terminaram o estudo). A carga das contrações foi de 50% da contração voluntária máxima, alternado os braços, que durava 45 segundos, com 1 minuto de intervalo entre cada série, que foram em número de 4. As sessões eram realizadas 5 vezes por semana durante 5 semanas (até completar 24 sessões). Os procedimentos de mensuração de PA e contração voluntária máxima foram iguais ao estudo 1. Além disso, apenas no estudo 2, a PA também foi medida após 5 semanas de destreino.
No estudo 1, a PA sistólica de repouso diminuiu de 134,1 (±0,95) mmHg para 121,4 (±1,34) mmHg e a PA diastólica diminuiu de 86,5 (±2,78) para 71,6 (±3,50) mmHg. No estudo 2, a PA sistólica diminuiu de 127,0 (±2,28) mmHg para 117,5 (±2,23) e retornou a 126,8 (±1,84) no destreino. A PA diastólica declinou de 86,6 (±1,85) para 77,4 (±1,49) e retornou a 86,6 (±1,34) no destreino.
Segundo o autor, dois estudos demonstram que a PA durante breves esforços isométricos não aumenta a níveis que comprometam a segurança dos praticantes. Além disso, o treino de força produz modificações favoráveis m fatores de risco para doença coronariana, incluindo perfil lipídico e PA.
Em ambos os estudos ocorreu um declínio da PA em repouso, porém no estudo 2, observa-se que o efeito hipotensivo do treino foi reversível em um período similar ao tempo em que os efeitos foram alcançados.
A meta-análise de Kelley (9), que contou com estudos publicados entre Janeiro de 1966 e Dezembro de 1995, apresentou um total de 9 estudos, num total de 259 indivíduos (144 no grupo de exercício – GE – e 115 no grupo controle – GC, dos quais aproximadamente 79% e 72%, respectivamente, eram homens), com idades variando de 20 a 72 anos (média de 40 ± 17 anos para o GE e de 41 ±17 anos para o GC), não mostrando diferenças significativas entre o GE e o GC. Os grupos também não se diferiram entre outras características, como composição corporal, VO2 máx e FC de repouso. As características dos programas variaram de 6 a 26 semanas, de 3 a 6 dias por semana, de 1 a 3 séries, de 5 a 25 repetições (Tab 2). Poucos estudos relataram o tempo de descanso entre as séries. A PA sistólica variava de 113.30 to 148.12 mmHg (média de 132,71 ±11,27 mmHg) e a PA diastólica variava de 69.0 to 95.80 mmHg (média de 82,28 ±10,62 mmHg).
Os resultados de PA demonstraram um declínio médio de –4,55 ±5,69 mmHg para a PA sistólica e de –3,72 ±3,46 mmHg, com uma variação desse declínio entre –0,18 para –8,93 e entre –1,06 e –6,38, respectivamente (Tab 3).
O estudo de Taylor (10), no qual além da mensuração da PA e FC, foi avaliada também a modulação do controle autonômico (relação entre o tônus simpático e o vagal). O estudo contou com 17 sujeitos (10 homens e 7 mulheres), divididos em grupo de exercício (GE; n= 9) e grupo controle (GC; n= 8) e todos eram diagnosticados hipertensos (PA sistólica ³ 140 mmHg e PA diastólica ³ 85 mmHg). O treino isométrico de contração de mãos foi feito 3 dias por semana durante 10 semanas, consistindo em 2 minutos de contrações isométricas a 30% da contração voluntária máxima (avaliada em dinamômetro) com as duas mãos e o período de repouso entre as séries foi de 1 minuto.



A PA sistólica diminuiu no grupo treinando de 156 ±9.4 mmHg para 137 ±7.8 mm Hg e a PA diastólica mostrou um declínio não significativo, passando de 82 ±9.3 mm Hg to 75 ±10.9 mmHg. A PA média mostrou um declínio de 11 mmHg (de 107 ±8.53 mm Hg para 96 ±8.7 mm Hg). O GC mostrou reduções na PA, porém menores que no GE. Para PA, a relação entre tônus simpático e tônus vagal mostrou um declínio significativo do tônus simpático.
O GE não apresentou modificações na FC de repouso, porém o GC apresentou um aumento. Para a FC a relação entre o tônus simpático e o tônus vagal apresentou uma tendência de aumento no tônus vagal, porém estatisticamente não significante. Não obstante o grupo controle apresentou uma tendência oposta.

Insuficiência Cardíaca Congestiva
Pacientes com insuficiência cardíaca congestiva (ICC) apresentam uma diminuição de força muscular o que limita a qualidade de vida desses indivíduos (11). Além do declínio da força, esses pacientes apresentam debilitados quanto ao VO2 máx.. Embora muitos programas de reabilitação tenham se focado em exercícios de endurance, o treino de força tem chamado a atenção por poder ser, quando progressivamente adaptado, possível e seguro de ser aplicado a esse tipo de população (11).
Devido a isso, Delagardelle e colaboradores (11) estudaram os efeitos de um treino aeróbico contra os efeitos de um treino combinado (treino de força e aeróbico). O estudo contou com 20 pacientes clinicamente estáveis com ICC, dos quais 10 pertenceram ao grupo aeróbico (GA) e 10 ao grupo combinado (GC). Foram avaliados a PA, o VO2 máx. (teste indireto em bicicleta, onde os gases também foram analisados), função ventricular (diâmetro ventricular esquerdo, insuficiência mitral, fração de ejeção ventricular) e lactato sangüíneo (no período de repouso, entre os 3 minutos de descanso e no pico do VO2 máx.) e a força máxima nos extensores e flexores de joelho (em dinamômetro a 180º.s-1). Foi feito também um teste de resistência, com séries acima de 20 repetições.
O treino de GA foi realizado num ciclo ergômetro. Foi utilizado um regime de treinamento intervalado, com intervalos de 2 minutos a 50% do VO2 máx., seguido de intervalos de 2 minutos a 75% do VO2 máx., respectivamente, totalizando 40 minutos.
O GC combinou 20 minutos exercício aeróbico em bicicleta antes do treino de força, seguido de mais 20 minutos de treino de força. O treino aeróbico também foi realizado com intervalos de 2 minutos a 50% do VO2 máx. e seguido de mais 2 minutos a 75% do VO2 máx.. Para o treino de força foi realizado teste de 1 repetição máxima (RM). O treino consistia em 10 repetições a 60% de 1 RM. Cada repetição durava cerca de 6 segundos (3 segundos em cada fase – excêntrica e concêntrica).
Os pacientes participantes do estudo tinham saído do hospital a, pelo menos, 6 semanas e treinaram para o estudo durante 40 sessões.
O VO2 máx. aumentou 8% no GC e permaneceu inalterado no GA. O pico de lactato aumentou 25% no GC, considerando que houve um declínio no GA. Em ambos os grupos, a capacidade de trabalho aumentou 10%. A fração de ejeção ventricular aumentou 11% no GC e diminuiu 11% no GA. O diâmetro médio ventricular esquerdo diminuiu 3% no GC e aumentou 4% no GA. A insuficiência mitral foi moderada em 4 pacientes (dois em cada grupo) e média nos pacientes restantes.

Insuficiência Cardíaca Crônica
A insuficiência cardíaca crônica (ICCr) é caracterizada por uma miopatia do músculo esquelético e conduz a anormalidades esqueléticas como uma perda ou atrofia de fibras do tipo I, diminuição da capacidade enzimática oxidativa e da densidade mitocondrial, da força e resistência muscular. Há uma atrofia específica de fibras do tipo I, fazendo com que o recrutamento das fibras do tipo II ocorra mais precocemente, ocasionado uma intolerância geral ao exercício.
Segundo Pu et al. (12), pacientes com insuficiência cardíaca crônica são comparáveis a mulheres idosas com outras doenças crônicas, com prejuízo funcional e sem diagnóstico clínico ou sintomas físicos de insuficiência cardíaca crônica. Com isso, seu estudo contou com 16 mulheres idosas (65 anos ou mais), comparadas com 80 mulheres (de mesma idade) com insuficiência cardíaca crônica, apresentando média, moderada e estável insuficiência cardíaca sistólica, randomizadas para o grupo de treino e para o grupo controle. Essa população foi submetida um treinamento progressivo de força a 80% de 1 RM em equipamentos de resistência pneumáticos. Eram realizadas 3 séries de 8 repetições, sendo que cada repetição durava cerca de 6 a 9 segundos, com 2 a 3 segundos de descanso entre as repetições e de 60 a 90 segundos de descanso entre as séries. Entre cada exercício havia um tempo de descanso de 1 a 3 minutos. Antes da sessão, os sujeitos realizavam um aquecimento de 2 minutos caminhando na esteira ou pedalando num ciclo ergômetro e 5 minutos de alongamento. O grupo placebo realizava exercícios de alongamento. O treino foi realizado durante 10 semanas.
Foram avaliados pré e pós-treino a capacidade geral de exercício (6 minutos de caminhada para verificar a distância), metabolismo e histologia muscular (biópsia muscular), VO2 máx. (de forma indireta), 1 RM, massa muscular total (estimada através da excreção de creatinina durante 24 horas) e a função cardíaca (função ventricular).
As mulheres com ICCr apresentaram menor força e massa muscular que as mulheres sem ICCr nos músculos da perna, depois de se ter ajustado por idade e número de doenças crônicas. O VO2 máx. foi levemente menor (mas sem significância estatística) nas mulheres com ICCr. Também foram menores nas mulheres com ICCr a capacidade geral de exercício, a média de fibras do tipo I por área e a excreção de creatinina.
Os teste de seis minutos de caminhada aumentou substancialmente após o treino, significativamente relacionado com a proporção e área de fibras do tipo I, com a força e resistência dos extensores de joelho e com a capacidade enzimática oxidativa.
A força e resistência muscular aumentaram em todos os músculos treinados. Houve uma tendência, porém não significante, de aumento de massa muscular. A capacidade oxidativa muscular aumentou substancialmente.
As análises histológicas do músculo esquelético demonstraram uma predominância de fibras do tipo II e não houve uma modificação na distribuição do tipo de fibras após o treinamento. Houve um relativo aumento na área das fibras dos tipos I e II (porém não significante). Não foram observadas mudanças na função cardíaca.

Conclusão

Primeiramente, antes de discutir as mudanças da PA decorrente de um treino de força, tem-se de observar as diferenças quanto ao seu modo de aferição, visto que, por ser uma variável sujeita a flutuações, diferentes modos (sentado ou deitado) ou tempo de repouso podem provocar alterações entre um estudo e outro.
Segundo Harris e Holly (6), o treino de força em circuito pode produzir estimulo suficiente para melhoras na força muscular, na composição corporal e na resistência cardiorrespiratória, devido à baixa intensidade e o curto período de intervalo entre as estações.
O consumo de oxigênio, como esperado nesse tipo de treino aumentou. Verificou-se que os indivíduos trabalharam a 78,6% da FC máxima e a 63,2% do VO2 máx.. Segundo o autor, o aumento do VO2 máx. pode ter ocorrido devido ao aumento de massa muscular, visto que em teste de esteira, nesse estudo, aumentou 6,8% e em ergômetro de braço aumentou 25,1%, com um aumento de 2,2% da massa corporal magra. Porém, deve-se considerar o fato dos testes serem indiretos e, portanto o VO2 máx. dependerá do tempo em exercício, com isso a resistência muscular pode ser “mascarada” por um aumento no VO2 máx., assim como no teste com o ergômetro de braço, em que o próprio autor coloca que o aumento no VO2 máx. verificado nesse teste pode ser devido ao aumento de força e endurance dos membros superiores.
A diminuição da PA diastólica chama a atenção pelo fato do exercício poder ser considerado uma ferramenta “anti-hipertensiva”, sendo que o treinamento de força em circuito (TFC) produz efeitos semelhantes ao exercício aeróbico. Outro ponto proposto pelo autor foi o fato de fazer com que os indivíduos se familiarizassem com os equipamentos antes de iniciar o estudo, fazendo com que um componente psicológico tenha influenciado na diminuição da PA diastólica. Mas essa interpretação é pouco viável, visto as referências em outros estudos que apresentaram diminuições na PA diastólica ao final de um programa de TFC, sendo mais provável adaptações fisiológicas após 9 semanas de treinamento.
Embora foi encontrado um aumento na massa magra e uma diminuição na soma das dobras cutâneas, não houve um declínio significativo na massa gorda, talvez pelo período de treinamento, pois períodos de 8 a 10 semanas de treinamento produzem pequenas modificações na composição corporal; ou também isso pode ser explicado pelo pequeno gasto calórico no curto tempo do treino (6).
Wiley et al. (8) elucidam que, mesmo não realizando medidas para verificar o mecanismo, a diminuição da PA decorrente de um treinamento de força (no caso desse estudo, treinamento isométrico) pode-se dever a mecanismos relativos a produção cardíaca e à resistência total periférica. Embora o exercício de força produza pobres aumentos no VO2 máx. e tenha outras diferenças em relação ao treinamento aeróbico, há a possibilidade da geração de sinais fisiológicos similares que podem alterar o trabalho cardíaco e a resistência periférica. Por exemplo, a PA sistólica média aumenta em ambos os exercícios. Embora a PA diastólica possa diminuir, estabilizar ou aumentar levemente durante o exercício aeróbico, o aumento da PA sistólica é relacionada à intensidade do exercício e é freqüentemente elevada o bastante para aumentar a PA média significativamente durante o exercício. Essa repetida exposição a essa resposta pressórica, talvez sirva como um estímulo a reorganização barorreceptora. O fato de ambas as PA sistólica e diastólica aumentarem juntas, repetidamente, pode servir como um estímulo suficiente para gerar mudanças reflexas. Influências neurais na resistência periférica total pode trazer mudanças na integração central da informação aferente muscular. Além disso, influências independentes ou concomitantes de substâncias endócrinas ou de “falsos-hormônios”, ativadas durante o período de elevação pressórica ou estimulação muscular, podem influenciar no diâmetro do vaso e, assim, na resistência periférica total.
Segundo Kelley (9), embora os mecanismos de redução da PA devam ser mais especificamente pesquisados, é sugerido que isso se deva a: 1) diminuição dos níveis de noraepinefrina plasmática; 2) diminuição da resistência periférica total; 3) alterações na função renal.
Taylor ainda acrescenta nesses mecanismos a modulação autonômica central, com uma elevação do tônus vagal, sugerindo que em indivíduos hipertensos pode haver uma elevação na modulação simpática. Com isso, sugere que mudanças na influência neurais simpáticas influenciam a resistência vascular total.
Tendo em vista essas considerações, pode-se levantar uma hipótese, através de um ponto em que os autores sempre enfatizam é a diminuição da resistência periférica total, através do estresse de cisalhamento, pois há um aumento da ação no óxido nítrico (NO-), ocasionando uma vasodilatação dos vasos e por um mecanismo barorreflexo, uma diminuição da PA.
Em pacientes com ICC, um treinamento de força de três meses pode ser um tempo suficiente para causar adaptações conhecidas do treinamento de força, como: 1) aumento no recrutamento de unidades motoras e em sua freqüência de disparo (13); recrutamento preferencial de fibras de velocidade de contração rápida ; 3) hipertrofia muscular (14). Embora nenhum desses mecanismos foram diretamente medidos no estudo de Delagardelle e colaboradores (11), alguns achados indicam aumento de massa muscular e um recrutamento preferencial de fibras do tipo II, pois aumentos no pico de torque e na força muscular realmente dependem também da área de seção transversa e massa muscular. E finalmente, um significante aumento no pico de lactato no grupo de treino combinado e uma diminuição no pico na taxa de troca respiratória (RER) no grupo de treino aeróbico podem confirmar a hipótese.
Nesse mesmo estudo (11), o autor coloca que o aumento na força muscular parece estar relacionado com efeitos benéficos no grupo combinado na função ventricular esquerda e no pico de VO2 máx., confirmando o papel chave das anormalidades no músculo esquelético em indivíduos com ICC. As “hipóteses musculares” dessa síndrome propõem que as alterações no músculo esquelético podem não apenas gerar sintomas, mas também pode contribuir, via mecanismo reflexo, para futuras ativações neurohormonais e a progressão da síndrome. É importante ressaltar que força muscular, pico de torque e resistência muscular também aumentaram no grupo de treinamento aeróbico, porém parece que o treino combinado oferece um estímulo mais forte para alterar a musculatura. Um aumento na força muscular pode contribuir para atenuar as ativações neurohormonais e a progressão da ICC.
Em pacientes com ICCr, em que há uma atrofia das fibras do tipo I, o treinamento de força possuiu uma importante função no que se refere ao aumento da área dessas fibras, além disso também trouxe aumentos em outras variáveis do estudo, como força e resistência muscular, VO2 máx., capacidade enzimática oxidativa (12).
Nota-se que pacientes com ICC e ICCr apresentam anormalidades no tecido muscular que provocam uma sensível queda da capacidade funcional, limitando a realização de atividades diárias e aumentando o tempo de recuperação no tratamento dessas cardiopatias. Sendo que no estudo de Pu et al. (12) nenhum dos pacientes apresentaram respostas hemodinâmicas adversas durante o tempo de treinamento. Isso demonstra que o treino de força pode ter um papel positivo nos programas de reabilitação de cardiopatas, visto que essas anormalidades musculares que podem agravar ainda mais o estado do paciente. Além de trazer alterações positivas no próprio coração, como em pacientes com ICC, em que um treino de força combinado com o treino aeróbico levou a um aumento na fração de ejeção ventricular (12).
Além disso, não só o treinamento aeróbico, mas também o treinamento de força pode ser um meio não-farmacológico que pode contribuir para a diminuição da PA em hipertensos ou normotensos. Enquanto mudanças na resistência periférica total seja o mais provável mecanismo envolvido no declínio da PA, mudanças na atividade cardíaca não podem ainda serem descartadas como parte desse mecanismo (8). Embora a redução na FC de repouso nem sempre é observada em treinos de força, o volume de ejeção pode ser alterado, acarretando mudanças na atividade cardíaca.

Referências

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