sexta-feira, 27 de março de 2015

Estudos sobre creatina - Parte 02: Função renal e hepática.

Mesmo depois de alguns anos na área fitness, observo um grande número de pessoas receosas e até com certo preconceito sobre a utilização de creatina como suplemento alimentar. Isso, além de vinculado por diversos meios de comunicação sem embasamento científico algum, também é reforçado por diversos profissionais relacionados ao esporte/nutrição consultados para entrevistas e também em seus locais de trabalho. Por isso, na parte 2 desse estudo sobre creatina que estou expondo aqui no blog, procurei destacar de maneira simples e rápida o grande equívoco que essas pessoas e profissionais estão cometendo. As informações foram colhidas em revisões de literatura e em artigos originais de revistas científicas através do Pubmed (portal de pesquisa científica online).

O trabalho de Gualano e colaboradores (2010) consistiu num estudo de caso em um paciente com baixa taxa de filtração glomerular e com apenas um rim (um deles foi removido). Nesse caso, a suplementação foi de 20 gramas/dia durante 5 dias (fase de saturação) e mais 5 gramas/dia durante 30 dias. Além disso, utilizou-se uma dieta com altas taxas de proteína (2,8 g/Kg peso corporal). Esse experimento em nada alterou a função renal do indivíduo.

O estudo de Robinson e colaboradores (2000) experimentou um tempo mais longo de suplementação, com a fase de saturação e mais nove semanas utilizando 5 gramas/dia. Aqui, novamente, não houve nenhuma alteração de função renal ou hepática com a suplementação de creatina. Os mesmos resultados foram encontrados durante oito semanas no estudo de Cancela e colaboradores (2008) com jogadores de futebol.



Como a suplementação de creatina também é utilizada em pacientes com doenças neurológicas, um estudo (Bender e cols, 2008) realizado com portadores de mal de Parkinson administrou creatina durante 2 anos com uma dose de 4g/dia. Nesse tempo, não houve quaisquer alterações na função renal dos pacientes. Outro estudo, conduzido por Kreider e colaboradores (2003), utilizou a suplementação em atletas saudáveis por 21 meses (primeira semana de saturação, com 20gr/dia; seguida de 5gr/dia até o fim do estudo) e também não houve quaisquer alterações em marcadores de função renal e hepática.

Outro estudo, realizado por Gualano e colaboradores (2008) utilizou altas doses de creatina (10 gramas/dia) durante três meses em indivíduos saudáveis praticantes de atividades aeróbicas. Em nenhum dos indivíduos houve alteração em marcadores de função renal.

O que muitas pessoas e, inclusive médicos, desconsideram é que o fato do aumento da excreção de creatinina pela urina não significa, primariamente, alguma anormalidade na função renal. Caso o paciente faça uso de creatina como suplementação, devem ser solicitados outros exames (Yoshizumi e cols, 2004). Pline & Smith (2005) observaram que as alterações na concentração de creatinina na urina sejam irrelevantes em indivíduos saudáveis.

Em sua revisão bibliográfica, Poortmans & Francaux (2000) também não encontraram estudos relevantes que acusasse qualquer contra-indicação da suplementação de creatina em pessoas saudáveis.

Todos os estudos comprovam o que muitos profissionais necessitam urgentemente saber e, claro, saber pesquisar antes de opinar sobre esse assunto. A suplementação de creatina é completamente segura em indivíduos saudáveis até em alguns casos de enfermidades renais (porém, nesses casos, o aconselhável é conversar com seu médico, chegar a algum acordo e sempre monitorar os marcadores renais e hepáticos através de exames laboratoriais). O interessante também é o reconhecimento cada vez maior da suplementação de creatina em doenças degenerativas e/ou neurológicas.

Por isso, quando alguém lhe falar sobre qualquer malefício desse tipo de suplementação em função renal e hepática, simplesmente peça para esse indivíduo estudar, sendo profissional ou não.


Referências:

Bender A, Samtleben W, Elstner M, Klopstock T. Long-term creatine supplementation is safe in aged patients with Parkinson disease. Nutr Res. 2008 Mar;28(3):172-8

Cancela P, Ohanian C, Cuitiño E, Hackney AC. Creatine supplementation does not affect clinical health markers in football players. Br J Sports Med. 2008 Sep;42(9):731-5.

Gualano B, Ferreira DC, Sapienza MT, Seguro AC, Lancha AH Jr. Effect of short-term high-dose creatine supplementation on measured GFR in a young man with a single kidney. Am J Kidney Dis. 2010 Mar;55(3):e7-9. Epub 2010 Jan 8.

Kreider RB, Melton C, Rasmussen CJ, Greenwood M, Lancaster S, Cantler EC, Milnor P, Almada AL. Long-term creatine supplementation does not significantly affect clinical markers of health in athletes. Mol Cell Biochem. 2003 Feb;244(1-2):95-104.

Poortmans JR, Francaux M. Adverse effects of creatine supplementation: fact or fiction? Sports Med. 2000 Sep;30(3):155-70.

Robinson TM, Sewell DA, Casey A, Steenge G, Greenhaff PL. Dietary creatine supplementation does not affect some haematological indices, or indices of muscle damage and hepatic and renal function. Br J Sports Med. 2000 Aug;34(4):284-8.

Yoshizumi WM, Tsourounis C. Effects of creatine supplementation on renal function. J Herb Pharmacother. 2004;4(1):1-7

sexta-feira, 20 de março de 2015

Estudos sobre creatina - Parte 01


Desde que se observou e comprovaram-se os aumentos de massa muscular decorrentes da suplementação de creatina combinada ao treinamento de força, além da sua utilização no tratamento de doenças degenerativas crônicas (Duchenne e miopatias inflamatórias) e doenças no sistema nervoso central (Parkinson' Huntington's e Alzheimer) (Gualano e colaboradores, 2010), a comunidade científica tem centrado as pesquisas nos mecanismos pelos quais esses benefícios são alcançados.
Muito já se falou, no que se refere aos benefícios da suplementação aliada ao treino de força, que seus benefícios se davam simplesmente por aumentar a intensidade do treino ao se conseguir realizar mais repetições com determinada carga. Ou também devido à retenção hídrica na célula muscular.
Entretanto, estudos como o Olsen e colaboradores (2006) demonstram mecanismos mais complexos. Ao suplementar com creatina, observaram aumentos no número de células satélites e nos núcleos das células musculares por fibra muscular.

Creakic, da Muscletech: um dos produtos à base de creatina da minha preferência

Então, você deve estar se perguntando... o que são células satélites?
São as chamadas “células tronco miogênicas”, ou seja, células relacionadas á recuperação muscular, que atuam diante de uma lesão ou qualquer dano no músculo esquelético.
Com isso, através da suplementação de creatina, verificamos uma melhora no processo de recuperação tecidual após o treinamento de força.
Aguarde mais esclarecimentos sobre creatina nas próximas postagens...

Referências:

Gualano B, Artioli GG, Poortmans JR, Lancha Junior AH. Exploring the therapeutic role of creatine supplementation. Amino Acids. 2010 Jan;38(1):31-44. Epub 2009 Mar 1.

Olsen S, Aagaard P, Kadi F, Tufekovic G, Verney J, Olesen JL, Suetta C, Kjaer M. Creatine supplementation augments the increase in satellite cell and myonuclei number