segunda-feira, 24 de abril de 2017

Cacau auxilia a perda de gordura


Provavelmente, você já deve ter ouvido falar sobre os efeitos do cacau puro, mais especificamente de seus flavonóides. Aí podemos falar sobre suas propriedades antioxidantes, na regulação da pressão arterial, raciocínio e até perda de gordura. 
Especificamente, sobre a perda de gordura, funciona? Sim. E qual seria o mecanismo? 
O estudo de Matsumura e colaboradores (2014), realizado em ratos, comparou os efeitos do flavonóide encontrado no cacau (flavan-3-ols) com outro flavonóide, a epicatequina. A ingestão de cacau aumentou de maneira mais significativa os níveis de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina), além da expressão de genes responsáveis pela termogênese e pela lipólise. Ou seja, tivemos um aumento das atividades lipolítica e termogênica.


Também em ratos, Matsui e colaboradores (2005) quiseram elucidar os mecanismos moleculares pelo qual o cacau pode diminuir a gordura visceral. Utilizaram 21 dias de dieta com alto teor de lipídeos com ou sem cacau na dieta. Após o experimento, os ratos que ingeriram cacau apresentaram peso corporal, gordura visceral e triglicerídeos menores. Além disso, as análises de DNA demonstraram uma menor expressão dos genes envolvidos na síntese de ácidos graxos no tecido adiposo branco e no fígado. 
Muito interessante o estudo e os resultados do recentíssimo estudo de Sansone e colaboradores (2017), em que verificaram se há interação entre os flavonóides do cacau e metilxantinas (como a cafeína) em humanos na função cardiovascular. A cafeína sozinha, não alterou a vasodilatação via fluxo sanguíneo e a circulação de células angiogênicas. Ao passo que os flavonóides os aumentaram e o fizeram em maior magnitude quando combinados com cafeína. Provavelmente, metilxantinas devem aumentar a absorção dos flavonóides, elevando sua concentração no plasma sanguíneo quando ingeridos concomitantemente.  
Temos então a atuação dos flavonóides do cacau estimulando a lipólise via adrenérgica, através da lipogênese e também um efeito de bloqueio na lipogênese (síntese do tecido adiposo). Vale ressaltar que a abordagem é sobre o cacau PURO, sem adição de açúcares (que gera picos de insulina e estimula a lipogênese) ou gorduras saturadas. Tendo deixado isso claro, adicione cacau em sua dieta, inclusive como pré-treino!

Referências
Matsui N, Ito R, Nishimura E, Yoshikawa M, Kato M, Kamei M, Shibata H, Matsumoto I, Abe K, Hashizume S. Ingested cocoa can prevent high-fat diet-induced obesity by regulating the expression of genes for fatty acid metabolism. Nutrition. 2005 May;21(5):594-601.

Matsumura Y, Nakagawa Y, Mikome K, Yamamoto H, Osakabe N. Enhancement of energy expenditure following a single oral dose of flavan-3-ols associated with an increase in catecholamine secretion. PLoS One. 2014 Nov 6;9(11):e112180. 

Sansone R, Ottaviani JI, Rodriguez-Mateos A, Heinen Y, Noske D, Spencer JP, Crozier A, Merx MW, Kelm M, Schroeter H, Heiss C. Methylxanthines enhance the effects of cocoa flavanols on cardiovascular function: randomized, double-masked controlled studies. 2017 Feb;105(2):352-360. doi: 10.3945/ajcn.116.140046. Epub 2016 Dec 21.

segunda-feira, 27 de março de 2017

Flexão de cotovelos (Rosca Bíceps) com braço reto ou inclinado?

No post anterior, abordei a questão do tríceps, se com tronco inclinado ou não.
Quando falamos no bíceps, a questão do tronco inclinado para frente ou para trás, obviamente já está fora de cogitação (embora algumas pessoas possam parecer um pêndulo na execução do movimento, para colocarem mais carga). Mas o braço? Potencializamos a ação do bíceps com ele reto ou levemente avançado, realizando uma leve flexão de ombros? (vejam que, em ambos os casos, o braço parte da posição reta, não estou falando da rosca bíceps com o braço avançado em toda amplitude, que deixarei para um próximo post).
Primeiramente, vamos levar em consideração os seguintes pontos (citados no post anterior) e, a partir da análise biomecânica, você mesmo poderá responder a questão.
- quanto maior o braço de alavanca (ou braço de momento) ao qual o músculo é submetido, maior o estímulo;
- maior amplitude articular e/ou onde o músculo fica sob tensão provocam maiores alterações bioquímicas;
- o músculo, quando mais alongado, é mais ativado.




O mesmo exemplo vale para a flexão de cotovelos em posição sentada ou de pé.
Como vemos na figura, o braço de alavanca em ambos os casos são praticamente iguais, quando o antebraço está na horizontal. Porém, ao flexionar o cotovelo, o antebraço fica quase vertical na figura 2, praticamente anulando a linha azul, reduzindo muito o braço de momento. Na figura 1, o braço de momento se faz presente em toda amplitude de movimento (aumentando a tensão em toda a amplitude).
Outro fato importante é que o bíceps, sendo um músculo multiarticular, suas origens passam pelo ombro. Sua porção mais próxima ao ombro ficaria mais encurtada na figura 2, diminuindo sua ativação.
Lembrem-se que fisiculturismo é diferente de halterofilismo. No segundo, o objetivo é mover o maior peso possível do ponto A ao ponto B; no primeiro, é necessário estimular a musculatura, de modo que ocorram alterações bioquímicas necessárias para gerar supercompensação no tecido muscular. Logo, o ideal seria utilizarmos a execução de maior estímulo muscular.



terça-feira, 7 de março de 2017

Tríceps com o tronco inclinado ou reto?

Algo que vejo muito nas academias e nos "gurus" de instagram são dicas de exercícios que "pega" mais ou onde se coloca mais carga. Mas o que seria "pega" mais? Colocar uma carga externa maior necessariamente estimula mais o músculo?
Vamos falar hoje sobre o tríceps na roldana e a posição do tronco. Deveria ficar reta ou inclinada?

Fonte: Muscle and Motion


Primeiramente, o vídeo mostra que é mais interessante isolar o movimento na extensão do cotovelo (evitando o movimento dos ombros ou elevação das escápulas). Com isso, teremos o estímulo numa maior amplitude articular.
No caso do posicionamento do tronco, de qualquer forma teremos um bom estímulo ao tríceps braquial. Mas, como podemos potencializá-lo?



Com a coluna inclinada, temos um alongamento bem pouco proeminente da cabeça longa do tríceps (bi-articular, passando pela gleno-umeral). O que, dependendo da proporcionalidade entre elas, pode-se tornar uma conduta interessante,
Porém, com a coluna inclinada, colocamos o peso do corpo sobre a barra, o que facilitaria o movimento e permitiria movimentar uma carga externa maior. Com a coluna reta, há uma amplitude de movimento maior (linhas amarelas), de aproximadamente 123 graus; contra aproximadamente 88 graus com a coluna inclinada (Escamilla, 2001). Segundo Nosaka e Sakamoto (2001), embora menores amplitudes produzam um trabalho mecânico maior, um movimento mais alongado produz maiores alterações bioquímicas. A tensão sobre a coluna também é menor com a coluna reta (braço de alavanca representado pela linha verde).
Ou seja, excetuando questões de isolamento de determinada porção do tríceps braquial, pessoalmente prefiro a posição ereta. Com uma carga externa menor, diminuindo o risco de lesões (Delos e cols, 2013), pode-se produzir um estímulo bioquímico maior e com maior amplitude.

Referências

Delos, Demetrius; Maak, Travis G.; Rodeo, Scott A. Muscle Injuries in Athletes: Enhancing Recovery Through Scientific Understanding and Novel Therapies. Sports Health: 5(4): 346–352 (2013)


Nosaka K.; Sakamoto, K. Effect of joint angle on the magnitude of muscle damage to the elbow flexors. Medicine and Science in Sports Exercise: 33(1):22-29 (2001)

quinta-feira, 2 de março de 2017

HIIT: uma leitura crítica

O acúmulo de gordura abdominal é um preditor para doenças cardiovasculares, diabetes e diversos marcadores inflamatórios. Por esse motivo, intervenções para otimizar a perda de gordura, especificamente nessa região, têm sido pesquisadas. Nesse sentido, o treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) ganhou manchetes, aparece como "salvação" contra a obesidade dentre "gurus" do fitness, instragrans etc. Mas, embora ainda não tenhamos estudos suficientes para estabelecer um alto grau de evidência, vamos ver o que a literatura tem demonstrado e ter muito cuidado ao ler e interpretar os resultados (por isso já disse em meu instagram várias vezes e repito, estudos científicos não podem cair nas mãos de qualquer um).
Vamos iniciar com dois estudos que demonstram superioridade do protocolo intervalado de alta intensidade. No estudo de Maillard e colaboradores (2016), foi comparado um protocolo de 60 tiros de 8 segundos (77-85% Frequência cardíaca máxima) com outro de 40 minutos a 55-60% FCmáx. O protocolo foi realizado duas vezes por semana, durante 16 semanas em 71 mulheres com diabetes tipo II. A perda de gordura foi semelhante nos dois grupos, sendo que no grupo de alta intensidade, houve maior perda de gordura abdominal subcutânea e visceral. No estudo de Cheema e colaboradores (2015), foi comparado um treino intermitente de box versus uma leve caminhada. Em todos os parâmetros, o treino intermitente foi superior (VO2máx, diminuição do percentual de gordura, diminuição da pressão sistólica etc).
Em ambos os estudos, há limitações metodológicas que podem comprometer os resultados. No estudo de Maillard e cols (2016), apenas compararam a ingesta calórica dos indivíduos e viram que não havia diferenças, ou seja, não propuseram o mesmo déficit calórico individualmente. A intensidade foi ajustada pela frequência cardíaca máxima (em academias, na prática, pode ser um bom marcador de intensidade; mas não seria um padrão ótimo para pesquisa científica). E, assim como no estudo de Cheema e cols (2015), o gasto calórico total de ambos os protocolos não foi informado ou mensurado. No estudo de Cheema, a dificuldade em comparar os protocolos é mais complicada, pois foi realizado um treino de box (que apresentou maior aderência da amostra), com a mensuração da intensidade através de um monitor cardíaco, sem dados sobre gasto calórico.
O recente estudo de Zhang e cols (2017) equalizou os protocolos com o mesmo gasto calórico (300 KJ/sessão) e não demonstraram diferenças na perda de gordura, diminuição da gordura abdominal ou visceral. No estudo de Lazzer e cols (2016), realizado em adolescentes obesos, tiveram o cuidado de controlar a ingestão calórica, promover uma educação nutricional em três diferentes protocolos: baixa intensidade (40% VO2máx.); alta intensidade (70% VO2máx.; e HIIT. O VO2máx. aumentou de forma mais acentuada no grupo de alta intensidade e HIIT. Todos os grupos exercitados perderam gordura corporal, mas o grupo de baixa intensidade foi superior.
E quando combinamos musculação (treino resistido ou RT), realizando o treino concorrente? Muito  se diz sobre uma interferência no treino aeróbico de moderada intensidade (AE) na massa muscular para quem realiza musculação (embora muitas pesquisas demonstram ser mínimo ou inexistente) e que a realização de HIIT seria superior. O estudo de Fyfe e cols (2016) mensurou o ganho de massa magra em três grupos: RT, RT+HIIT, AE+RT. O grupo que só realizou RT aumentou 4,1+-2,0% de massa magra; o grupo AE+RT aumentou 3,6+-2,4% de massa magra; o grupo RT+HIIT aumentou apenas 1,8+-1,6% de massa magra.



Para complicarmos ainda mais essa questão, todos os estudos que compararam aeróbico de intensidade moderada contra HIIT, o fizeram em intensidades diferentes, mas sempre o primeiro contínuo e o segundo intervalado. O que aconteceria se ambos os protocolos fossem intervalados? Jimenez-Pavon e Lavie (2017) encontraram apenas 3 estudos que fizeram o exercício moderado de maneira intermitente, como o HIIT, e não encontraram diferenças nos resultados. Aí temos o questionamento: é a intensidade ou o modo do estímulo (intermitente ou contínuo) que pode trazer benefícios? Teríamos então o treinamento moderado intermitente?

Não estou aqui dizendo que o HIIT não possui benefícios. Claro que emagrece, promove modificações positivas em diversos marcadores... Caso você realmente não possui tempo e/ou apresenta maior aderência a essa metodologia, continue aonde está. Mas tenham muito cuidado em afirmar categoricamente a superioridade de um método sobre outro, ainda mais vindo de "gurus" do fitness sem qualquer trabalho original publicado em periódicos ou que apenas observam as conclusões dos estudos, sem terem a mínima noção de interpretar e analisar suas limitações. Lembrem-se, muitos apenas querem vender livros, cursos ou a imagem.

Referências

Cheema BS, Davies TB, Stewart M, Papalia S, Atlantis E. The feasibility and effectiveness of high-intensity boxing training versus moderate-intensity brisk walking in adults with abdominal obesity: a pilot study. BMC Sports Sci Med Rehabil. 2015 Jan 16;7:3. doi: 10.1186/2052-1847-7-3. eCollection 2015.


Jiménez-Pavón D, Lavie CJ. High-intensity intermittent training versus moderate-intensity intermittent training: is it a matter of intensity or intermittent efforts? Br J Sports Med. 2017 Jan 30. pii: bjsports-2016-097015. doi: 10.1136/bjsports-2016-097015.

Lazzer S, Tringali G, Caccavale M, De Micheli R, Abbruzzese L, Sartorio A. Effects of high-intensity interval training on physical capacities and substrate oxidation rate in obese adolescents. J Endocrinol Invest. 2017 Feb;40(2):217-226. doi: 10.1007/s40618-016-0551-4. Epub 2016 Sep 17.

Maillard F, Rousset S, Pereira B, Traore A, de Pradel Del Amaze P, Boirie Y, Duclos M, Boisseau N. High-intensity interval training reduces abdominal fat mass in postmenopausal women with type 2 diabetes. Diabetes Metab. 2016 Dec;42(6):433-441. doi: 10.1016/j.diabet.2016.07.031. Epub 2016 Aug 24.

Zhang H, Tong TK, Qiu W, Zhang X, Zhou S, Liu Y, He Y. Comparable Effects of High-Intensity Interval Training and Prolonged Continuous Exercise Training on Abdominal Visceral Fat Reduction in Obese Young Women. J Diabetes Res. 2017;2017:5071740. doi: 10.1155/2017/5071740. Epub 2017 Jan 1.